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O Ministério Público do Trabalho, na qualidade de defensor dos interesses coletivos e dos direitos sociais constitucionalmente garantidos, ajuizou Ação Civil Pública contra a Vale S.A e Collem Construtora Mohallem Ltda., noticiando ofensa à dignidade humana dos trabalhadores, pelo fato de a mineradora estar exigindo dos seus empregados, de forma aleatória, a realização de testes do bafômetro e outros exames toxicológicos, visando apurar vestígios de substâncias psicoativas. De acordo com o MPT, esses exames são utilizados pelas empresas com o fim de identificar trabalhadores potencialmente “problemáticos” em razão do uso de substância psicoativa, lícita ou ilícita, dentro ou fora do trabalho, os quais costumam ser sumariamente dispensados porque seriam improdutivos. Argumentou que a conduta das empresas reforça a estigmatização dos empregados com resultados positivos nos exames, sendo ofensivo à intimidade e à honra dos trabalhadores. Por isso, requereu que o Juízo determine a essas empresas que se abstenham de submeter seus empregados a esses exames toxicológicos e que deixem de efetuar dispensa arbitrária de empregados com resultado positivo nos exames, que sejam portadores de garantia de emprego. O MPT também requereu a reintegração de todos os empregados dispensados de forma discriminatória, motivada por resultados de exames toxicológicos positivos para substâncias psicoativas, além de indenização por dano moral coletivo e indenizações individuais para cada um desses empregados.

O caso chegou às mãos do juiz Adriano Antônio Borges que, após analisar detidamente a matéria, rejeitou os argumentos do MPT e indeferiu os pedidos. De acordo com o magistrado, a preocupação trazida na ação civil pública tem sido levantada em inúmeras ações individuais ajuizadas pelos trabalhadores que vivenciam a mesma situação. Todas elas, nas palavras do juiz, trazem à tona uma dualidade típica da sociedade moderna: liberdade individual X saúde coletiva. A partir daí, apontando para uma “idolatria ao ‘eu’ que vem transformando a nossa era num caos”, o magistrado passa a fazer uma profunda reflexão, buscando apoio na filosofia para a solução do caso concreto. “Cada vez que um de nós se recusa a ser instrumento da paz social (submissão a exames que visam proteger a integridade física ou psíquica dos outros), sob o prisma puramente jurídico, estamos violando o princípio da isonomia na medida em que não nos comportamos como iguais, ou seja, como sujeitos que escolhem o bem comum da nossa comunidade, leia-se ambiente do trabalho. Ser igual no mundo do trabalho também significa deixar que o outro seja livre, isto é, realize sua humanidade profissional em paz e sem risco de morte”, explica.

Para o julgador, o que o Ministério Público e a sociedade têm de entender é que, ao defenderem incondicionalmente um direito puramente individual (que implica, por vezes, esconder as próprias mazelas), “estão atribuindo ao indivíduo um enorme e perigoso poder contra a sociedade, ferindo, também, os princípios constitucionais da solidariedade social, art. 3º, I, e da função social do contrato de emprego, art. 1o., IV, da CR”. Ele destaca que o conflito em questão está exatamente na fronteira entre o preservar absolutamente a dignidade subjetiva e individual e o preservar objetivamente a saúde coletiva (produto da soma da saúde individual, difusa e social) e o meio ambiente do trabalho, já que o risco de acidente e de morte é alto nas áreas da mineradora reclamada.

Por fim, o juiz sentenciante chama a atenção para o fato de que a Constituição Federal preconiza que a higidez do meio ambiente do trabalho e a saúde coletiva são bens insuperáveis de um Estado Democrático de Direito. Por isso, considera correto o procedimento da mineradora de exigir aleatoriamente dos seus funcionários o uso do bafômetro e outras medidas que preservam a saúde individual, coletiva e social.

O julgador ressaltou ainda que nenhuma dignidade é maior que a vida e a saúde do meio ambiente do trabalho e da coletividade e, portanto, “por altruísmo”, todo o trabalhador deveria se submeter espontaneamente ao bafômetro e aos demais exames exigidos pela mineradora. Para finalizar, ele observou que essa conduta, lentamente, vem sendo sancionada pela lei, referindo-se ao artigo 235-B, VII, da CLT, que trata do serviço do motorista profissional.

Dispensa discriminatória

Ao analisar as alegações do MPT de que a empresa Collem Construtora estaria dispensando, de forma arbitrária, os empregados que obtinham resultados positivos nos testes toxicológicos, o magistrado ressaltou que, “a assunção ‘consciente’ dos riscos profissionais e psicofísicos de uma recusa a tratamento especializado não pode ser levada às raias da discriminação, até porque o objeto protegido transcende a individualidade e atinge toda a comunidade”. Ele frisou que o Programa de Prevenção e Tratamento da Dependência Química estabelecido pela mineradora reclamada merece incentivo social e jurídico, já que demonstra cuidado com o trabalhador e a sociedade.

Em sua visão, ainda que tenha ocorrido uma eventual quebra do sigilo na convocação para o exame, a empresa não teve a intenção de prejudicar o trabalhador. Quanto à justa causa aplicada a um empregado direto da Collem, noticiada na ação pelo MPT, para o juiz, trata-se de situação isolada, já resolvida em ação individual ajuizada pelo trabalhador, não se incluindo no âmbito de competência do Ministério Público.

Com essas razões, ele indeferiu todos os pedidos do MPT.

Recurso. Sentença mantida no TRT/MG

O Ministério Público do Trabalho recorreu, mas a decisão de 1º Grau foi confirmada pela 3ª Turma do TRT-MG. O relator do recurso, desembargador Luís Felipe Lopes Boson, ressaltou que o Programa de Prevenção e Tratamento de Dependência Química criado pela Vale teve como alvo todos os seus empregados e os que lhes prestam serviços através de outras empresas, incluindo a Collem. E, na visão do relator, acolhida pela Turma, o objetivo da empresa foi prestar auxílio ao trabalhador e garantir a segurança no ambiente de trabalho.

Pela prova documental, o relator constatou que o programa não se restringe à simples realização de exames toxicológicos: “Trata-se de algo mais complexo, que busca, principalmente, a prevenção e o tratamento adequado do trabalhador, mediante acompanhamento de pessoal capacitado”, destacou.

Esse entendimento foi reforçado pelo fato de a mineradora ter firmado contrato com pessoal especializado para realização dos exames e auxílio no tratamento, além de ter elaborado cartilha e realizado estudos e palestras sobre o assunto, conforme notou o desembargador. Ele verificou ainda que a realização do teste toxicológico depende de uma série de normas, entre elas, a autorização expressa do empregado. E com o teste é possível detectar o uso de drogas (lícitas e ilícitas), incluindo substâncias que levem à diminuição da cognição e vigilância e que tornam arriscado, para o indivíduo que a utilizou e para a coletividade, o exercício de determinadas funções. Assim, a conclusão foi de que o teste serve como um importante instrumento de segurança do trabalhador, dos seus colegas de trabalho e da própria sociedade.

No mais, a prova testemunhal demonstrou que, caso fosse detectado o uso de alguma dessas substâncias, a empresa oferecia auxílio ao empregado, que era livre para aceitá-lo ou não, ficando, portanto, resguardado seu direito individual. Para o relator, ao fornecer esse tipo de ajuda ao empregado, a empresa age de acordo com os princípios da dignidade da pessoa humana e da solidariedade.

Ao perceber a existência de documentos contendo exemplos de trabalhadores que, apesar de testagem positiva para álcool e drogas, permaneceram prestando serviços à Vale, o relator afastou a afirmação do Ministério Público de que o objetivo dos testes seria a dispensa arbitrária e discriminatória do empregado. “Não vislumbro qualquer ato ilícito ou abuso de poder das rés. Ao contrário, é louvável a implantação do Programa de Prevenção e Tratamento de Dependência Química, com a realização de exame toxicológico, mediante sorteio aleatório e aquiescência espontânea do empregado sorteado, visto que tem por finalidade, dentre outras o cumprimento das normas de segurança no trabalho e reabilitação do empregado, para melhor exercício das suas funções e convívio com a coletividade, o que, evidentemente, redundará, em melhores condições de trabalho e, por consequência, uma maior produtividade”, finalizou o desembargador.

Seguindo o entendimento do relator, a Turma afastou a ilegalidade da conduta das empresas e manteve o indeferimento dos pedidos do MPT.

( 0001191-58.2014.5.03.0171 ED )

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região Minas Gerais, 02.12.2015

Um empregado da SOTEP – Sociedade Técnica de Perfuração S/A receberá R$ 6 mil por ter sido submetido a exames toxicológicos sem o seu consentimento. O Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (BA) havia absolvido a empresa da condenação, mas a Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho concluiu que o trabalhador teve sua integridade e privacidade violadas, pois cabia apenas a ele decidir se queria realizar exames para constatar a existência de drogas em seu organismo.

O empregado foi contratado para exercer o cargo de auxiliar de serviços gerais e, periodicamente, era submetido a exames. Durante a realização de uma dessas análises, descobriu que estava sendo submetido a exame toxicológico, realizado para detectar indícios de exposição ou ingestão de produtos tóxicos, drogas ou substâncias potencialmente causadoras de intoxicações. Inconformado com a atitude da empresa, o empregado ingressou em juízo e pleiteou indenização no valor de R$ 200 mil a título de dano moral, alegando violação da sua vida privada.

A Primeira Vara do Trabalho de Alagoinhas (BA) reconheceu a existência do dano moral e condenou a empresa ao pagamento de R$ 3 mil. Para o juízo de primeiro grau, a SOTEP invadiu injustificadamente a intimidade do trabalhador, pois não havia motivo relevante para a investigação feita, tendo em vista as atividades exercidas na empresa.

“Não há duvidas de que a realização de exame toxicológico sem a solicitação ou autorização do empregado importa invasão da privacidade e causa dano moral indenizável, ainda que não se tenha divulgado o seu resultado”, concluiu.

A SOTEP recorreu ao TRT-BA, que reformou a sentença e excluiu a condenação. Para os desembargadores, não houve comprovação inequívoca de que a empresa tenha causado qualquer dano moral ao trabalhador. Eles concluíram que “o dano moral só existe quando ocasionado por sofrimento, dor e humilhação que fogem à normalidade, interferindo intensamente no aspecto psicológico do indivíduo, causando intenso e permanente desequilíbrio, o que não restou evidenciado no caso”.

O empregado interpôs recurso de revista ao TST e a relatora, ministra Maria de Assis Calsing, lhe deu razão. Ela adotou entendimento firmado no Tribunal no sentido de que, demonstrada a conduta lesiva aos direitos da personalidade, é dispensável a comprovação do prejuízo para a caracterização do dano moral, por se tratar de algo presumível.

No caso, ao realizar exames toxicológicos sem prévio consentimento do trabalhador, a empresa atingiu sua integridade e invadiu sua privacidade, razão pela qual “não há como se afastar a condenação em indenização por dano moral”, concluiu. A decisão foi unânime para reformar o acórdão Regional e deferir indenização por dano moral no valor de R$ 6 mil, tendo em vista a finalidade pedagógica da medida.

(  RR -876-59.2010.5.05.0221 )

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho, por Letícia Tunholi, 18.02.2013

 

O consumo de substâncias químicas lícitas e ilícitas hoje é mais do que um problema dentro das empresas. Antes apenas relacionado aos mais jovens, o uso de drogas agora atinge o alto escalão até de multinacionais.

Desde funcionários terceirizados até executivos podem tornar-se dependentes por fatores como estresse, pressão por resultados, sobrecarga de trabalho, falta de reconhecimento e de “feedback” dos chefes.

O consumo de álcool e outras drogas tem afetado a vida de boa parte dos 82 milhões de trabalhadores brasileiros, com prejuízos enormes para as empresas. Segundo cálculos do Banco Interamericano do Desenvolvimento (BID), o Brasil perde por ano US$ 19 bilhões por absenteísmo, acidentes e enfermidades causadas pelo uso dessas substâncias.

Estatísticas recentes apontam o Brasil entre os cinco primeiros do mundo em número de acidentes no trabalho. São em média 500 mil por ano e 4 mil deles resultam em mortes. Os setores em que mais ocorrem são: construção civil, indústrias de metal e mecânica, eletroeletrônica, moveleiras e madeireiras.

O uso abusivo de drogas torna o candidato a uma vaga de emprego um fator de risco à comunidade laboral. O usuário de substâncias psicoativas lícitas e ilícitas tem 500% mais risco de acidente no trabalho, 900% de causar acidente com carro e 360% de causar acidentes envolvendo colegas, segundo dados da FIESP – Federação das Indústrias do Estado de São Paulo.

Mesmo diante de todas essas estatísticas, o Conselho Federal de Medicina – através do relator conselheiro Hermann Alexandre Vivacqua von Tiesenhausen – resolveu alertar os médicos quanto à realização de exames para detectar drogas no sangue de candidatos a vagas de emprego.

A alegação é de que “não é eticamente aceitável a solicitação de exames de monitoramento de drogas ilícitas, em urina e sangue, para permitir acesso ao trabalho, pois isso contraria os postulados éticos”.

Anthony Wong, chefe do Centro de Assistência Toxicológica do Hospital das Clínicas da FMUSP, contesta essa argumentação. Para o médico, os exames reforçam os anseios morais da população brasileira, que repudia a disseminação das drogas. “Os exames são instrumentos essenciais para diminuir os riscos de acidente e o “contágio” dos demais trabalhadores ao impor uma barreira à entrada de drogas”, avalia o toxicologista.

O médico rebate ainda que os exames não são discriminatórios, porque obedecem ao artigo 168 da CLT, aplicado independente de raça, sexo, religião e idade, e atendem às recomendações da Organização Internacional do Trabalho (OIT) em suas intervenções e recomendações sobre drogas no ambiente de trabalho.

Fonte: Revista Proteção / Jornal Cidade, 09.12.2012