Arquivo de janeiro, 2016

 

Representantes de entidades ligadas aos trabalhadores e ao Ministério Público do Trabalho (MPT) têm acompanhado de perto projetos de lei que tramitam no Congresso e pretendem flexibilizar direitos trabalhistas. Com o acirramento da crise econômica no país, há o temor de que a situação possa colaborar para a aprovação rápida dessas propostas, sem um debate prévio com a sociedade.

Entre os projetos estão o da ampla terceirização e os que excluem “condições degradantes” e “jornada exaustiva” do conceito de trabalho escravo. Outra proposta é a que aumenta a jornada diária de trabalho no campo de dez horas para até 12 horas.

No caso do trabalho escravo, a proposta em questão está no Projeto de Lei do Senado nº 432, de 2013, do senador Romero Jucá (PMDB-RO). O texto reduz o conceito de trabalho escravo já previsto no artigo 149 do Código Penal, passando a abranger apenas situações de trabalho forçado e servidão – excluindo-se condições degradantes e jornada exaustiva. O PL visa regulamentar a Emenda Constitucional nº 81, de 2014. Dentre outros pontos, a emenda prevê a expropriação de terras daquele que praticar trabalho escravo.

Em 15 dezembro, o texto quase foi levado à votação no plenário no Senado, sem passar pelas comissões necessárias. Em uma audiência pública na Comissão de Direitos Humanos, no mesmo dia, decidiu-se retirar o tema de pauta. O projeto continua em regime de urgência e poderá ser votado no início deste ano.

Segundo o secretário de relações institucionais do Ministério Público do Trabalho (MPT), procurador Sebastião Caixeta, um tema dessa relevância não pode ser aprovado sem ampla discussão, pois não se tratam de meras irregularidades trabalhistas. “A escravidão moderna não se caracteriza apenas pelo trabalho forçado. A situação, em alguns casos, é tão degradante, que em determinados locais os animais são melhor tratados do que as pessoas. Diminuir o conceito é reduzir as punições”, diz.

Entre janeiro e maio de 2015 foram resgatados 419 trabalhadores que viviam em situação análoga à escravidão, conforme o Ministério do Trabalho e Emprego. Desde 1995, cerca de 50 mil pessoas já foram resgatadas.

O assessor jurídico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Frederico Toledo Melo, afirma que a entidade, juntamente com a Confederação Nacional de Indústria (CNI), defendem que o trabalho escravo tenha um conceito mais objetivo, de forma que seja possível ter maior segurança jurídica.

“Os termos de jornada exaustiva e trabalho degradante não são usados na definição da OIT [Organização Internacional do Trabalho] e esses conceitos são muito vagos e ficam a mercê de diversas interpretações”, afirma.

Segundo Melo, somente 5% das autuações do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) são mantidas na Justiça Federal.

Outra proposta que teve a tramitação acelerada no Senado em 2015 é o PL nº 4.330 de 2004, do deputado Sandro Mabel, que autoriza a terceirização ampla no país. O texto já foi aprovado na Câmara dos Deputados e no Senado, registrado como Projeto de Lei da Câmara nº 30, de 2015.

De acordo com a secretária nacional de Relações do Trabalho da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Maria das Graças Costa, o projeto precisa ser rejeitado porque a condição dos terceirizados no Brasil é precária. Segundo pesquisa do Dieese, a cada cinco mortes por acidente de trabalho, quatro são de terceirizados e seus salários são 30% menores do que os celetistas.

“O que nos preocupa é que hoje são 35 milhões de trabalhadores que têm emprego fixo no Brasil e que poderão, em um curto espaço de tempo tornarem-se terceirizados”, diz. Atualmente, há 12 milhões de terceirizados no Brasil.

A aprovação do projeto de lei, segundo o secretário do MPT, Sebastião Caixeta, seria “um verdadeiro retrocesso”. Para ele, a terceirização ampla em toda a cadeia produtiva, pode dificultar a responsabilização do empregador por atos ilícitos durante o contrato de trabalho. Além disso, ao não limitar a terceirização à atividade meio, Caixeta afirma que ocorrerá a precarização da atividade do trabalhador.

A proposta que aumenta a jornada do trabalhador rural, por meio do PLS nº 627, de 2015, também tem sido acompanhada com lupa. O projeto permite até quatro horas extras diárias em momentos críticos da agricultura totalizando até 12 horas por dia.

Para Maria das Graças Costa, da CUT, o aprofundamento da crise econômica tem aumentado a pressão para flexibilizar os direitos dos trabalhadores.

Segundo Frederico Melo, assessor jurídico da CNA, no entanto, a jornada extraordinária de quatro horas já acontece em outras áreas, como os motoristas profissionais. Além disso, diz que o PL vincula o aumento da jornada à previsão em convenção coletiva.

“Para a agricultura isso é muito importante porque é um setor que sofre muito com a incidência de agentes externos, como pragas e problemas climáticos e, por isso, têm que, algumas vezes, antecipar ou agilizar a colheita”. Porém, conforme o advogado isso só aconteceria com a anuência dos trabalhadores e em situação extraordinária para não se perder a produtividade.

Outra alteração acompanhada é a proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 18, de 2011, do deputado Dilceu Sperafico (PP-PR). Ela autoriza o trabalho sob o regime de tempo parcial a partir de 14 anos de idade. Hoje a idade mínima é 16 anos. Entre 14 anos e 16 anos, os menores podem ser contratados como jovens aprendizes.

Fonte: Valor Econômico, por Adriana Aguiar, 27.01.2016

 

O Ministério Público do Trabalho (MPT) tem criticado os projetos de lei que tentam cancelar normas regulamentadoras (NRs) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). É o caso do Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 296, de 2011, que pretende anular a NR 12, sobre segurança do trabalho em máquinas e equipamentos.

De autoria do senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), o projeto aguarda votação na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado. De 1978, a NR 12 foi alterada em 2010.

Para o secretário de relações institucionais do MPT, procurador Sebastião Caixeta, a Constituição Federal permite que o Poder Legislativo cancele atos do Poder Executivo que tenham comprovadamente extrapolado a sua competência. “Não é o caso porque os técnicos do governo têm competência constitucional para, junto com uma comissão de representantes de trabalhadores e empregadores, estabelecer essas normas”, diz.

Para Caixeta, a NR 12 não pode ser simplesmente cancelada. “Podemos rediscutir prazos para as empresas se adaptarem, mas não dizer que a norma deixará de ser aplicada. As companhias não podem continuar matando e mutilando porque é caro se adaptar”, afirma. Para ele, o cancelamento só criaria um vácuo frente a uma norma objetiva.

Já na opinião da gerente-executiva de Relações do Trabalho da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Sylvia Lorena, a NR 12 é mais rigorosa do que as normas europeias sobre o tema. “Alguns itens são inexequíveis”, diz.

Para ela, não é porque existem máquinas mais seguras, que todas as antigas têm que ser substituídas. Ela cita como exemplo a obrigatoriedade da indústria automobilística, desde 2013, instalar airbag nos veículos novos. “Apesar de o item dar mais segurança, não se tirou de circulação todos os carros que não têm airbag e nem se obrigou o motorista a instalar”, diz.

Segundo Sylvia, a saúde e a segurança do trabalhador são irrenunciáveis, mas as regras têm que ter razoabilidade. “Não adianta ter uma norma ideal, que não é possível de ser cumprida”.

Fonte: Valor Econômico, por Adriana Aguiar, 27.01.2016